30 de julho de 2007

Poema de Outubro


Era o meu trigésimo ano rumo ao céu
Quando chegou aos meus ouvidos, vindo do porto
e do bosque ao lado,
E da praia empoçada de mexilhões
E sacralizada pelas garças
O aceno da manhã

Com as preces da água e o grito das gralhas e gaivotas
E o chocar-se dos barcos contra o muro emaranhado de redes
Para que de súbito
Me pusesse de pé
E descortinasse a imóvel cidade adormecida.

Meu aniversário começou com as aves marinhas
E os pássaros das árvores aladas esvoaçavam o meu nome
Sobre as granjas e os cavalos brancos
E levantei-me
No chuvoso outono
E perambulei sem rumo sob o aguaceiro de todos os meus dias.
A garça e a maré alta mergulhavam quando tomei a estrada
Acima da divisa
E as portas da cidade
Ainda estavam fechadas enquanto o povo despertava.

Toda uma primavera de cotovias numa nuvem rodopiante
E os arbustos à beira da estrada transbordante de gorjeios
De melros e o sol de outubro
Estival
Sobre os ombros da colina,
Eram climas amorosos e houve doces cantores
Que chegaram de repente na manhã pela qual eu vagava e ouvia
Como se retorcia a chuva
O vento soprava frio No bosque ao longe que jazia a meus pés.

Pálida chuva sobre o porto que encolhia
E sobre o mar que umedecia a igreja do tamanho de um caracol
Com seus cornos através da névoa e do castelo
Encardido como as corujas Mas todos os jardins
Da primavera e do verão floresciam nos contos fantásticos
Para além da divisa e sob a nuvem apinhada de cotovias.
Ali podia eu maravilhar-me
Meu aniversário Ia adiante mas o tempo girava em derredor.

Ao girar me afastava do país em júbilo
E através do ar transfigurado e do céu cujo azul se matizava
Fluía novamente um prodígio do verão
Com maçãs
Pêras e groselhas encarnadas
E no girar do tempo vi tão claro quanto uma criança
Aquelas esquecidas manhãs em que o menino passeava com sua mãe Em meio às parábolas
Da luz solar
E às lendas da verde capela

E pêlos campos da infância duas vezes descritos
Pois suas lágrimas me queimavam as faces e seu coração
se enternecia em mim.
Esses eram os bosques e o rio e o mar
Ali onde um menino
À escuta
Do verão dos mortos sussurrava a verdade de seu êxtase
Às árvores e às pedras e ao peixe na maré.
E todavia o mistério Pulsava vivo
Na água e nos pássaros canoros.

E ali podia eu maravilhar-me com meu aniversário
Que fugia, enquanto o tempo girava em derredor. Mas a verdadeira
Alegria da criança há tanto tempo morta cantava
Ardendo ao sol.
Era o meu trigésimo ano
Rumo ao céu que então se imobilizara no meio-dia do verão
Embora a cidade repousasse lá embaixo coberta de folhas no sangue de outubro.

Oh, pudesse a verdade de meu coração
Ser ainda cantada
Nessa alta colina um ano depois.




Autor: Dylan Marlais Thomas
Tradução: Ivan Junqueria
Fonte: www.culturapara.art.br/opoema/opoema.htm


Um pouco sobre o autor:

Dylan Marlais Thomas nasceu em Swansea, no País de Gales, a 27 de outubro de 1914. Considerado um dos maiores poetas do século XX em língua inglesa, juntamente com W.Carlos Williams, Wallace Stevens, T.S. Eliot e W.B. Yeats. Dylan Thomas teve uma vida muito curta, devido a exagerada boemia que o levou ao fim de seus dias aos 39 anos, mas, ainda teve tempo de nos deixar um legado poético que o tornou um dos maiores influenciadores de toda uma geração de escritores."